1º Ano do Ensino Médio

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INSTRUÇÕES

Queridos alunos do 1º Colegial, Espero que todos sejam bem vindos a esse espaço virtual.

Nosso site tem a intenção de ser uma ferramenta colaborativa com o processo de ensino-aprendizagem desenvolvido em Sala de Aula.

Como é o primeiro acesso de muitos de vocês em nosso site, além das boas vindas, quero também fazer alguns esclarecimentos a respeito do funcionamento desse espaço.

- esse é um espaço para COLABORAR com as atividades que são desenvolvidas em sala de aula.

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- todo o conteúdo do site é de livre acesso a todos os visitantes, contudo, as atividades propostas para cada nível de ensino (Básico ou Superior) serão sempre direcionadas em sala de aula pelo professor.

- nos “comentários” será permitido ao visitante expressar livremente sua opinião, desde que seja para o enriquecimento e melhoria desse espaço. Qualquer comentário ofensivo, de qualquer Natureza, a quem quer que seja, será imediatamente DELETADO.

- Além do material desenvolvido em sala, sempre procuramos apresentar aqui alguns recursos diversificados, como vídeos, hipertextos e links para outros materiais que consideramos pertinentes aos temas desenvolvidos, portanto, DESEJAMOS QUE VOCÊ UTILIZE O MÁXIMO POSSÍVEL E TAMBÉM, SEMPRE QUE POSSÍVEL, DEIXE SEU COMENTÁRIO E SUAS SUGESTÕES.

Abraços e um ano letivo proveitoso para todos!


 

 




 

 

 

O que é Filosofia

Para o 1º Colegial - (Turmas E; F e G)

 

 

 

A palavra FILOSOFIA se originou de outras duas palavras:

 

Filia = Amizade, amor, paixão (afeto)

 

Sophya = conhecimento, sabedoria.

 Embora tenha seu nascimento datado no fim do séc VII a.c., e o primeiro filósofo considerado pela tradição seja Tales de Mileto (624 – 546 a.c.), a Filosofia somente recebe esse nome por volta de 530 a.c. de Pitágoras de Samos (570 – 496 a.c.) ao afirmar, quando perguntado sobre sua função: “Sou um amante da Sabedoria”.

 Assim, a palavra filosofia [φιλοσοφία] quer dizer “Amante da sabedoria”. Cabe aqui tecermos algumas considerações acerca dessa definição, que embora pareça simples, é de uma complexidade enorme. Não podemos nos esquecer de que estamos falando de uma designação construída há mais de 25 séculos, e portanto, deve ser analisada com muito cuidado para se evitar as imprecisões.

Por phylia = “amante”, a palavra filosofia quer significar aquilo que realmente nos afeta, ou seja, aquilo que provoca, de alguma forma, uma mudança na vida cotidiana, seja ela no comportamento, nas crenas, ou nos valores do indivíduo. Por sua vez, a palavra sophia = sabedoria quer significar o conhecimento verdadeiro, válido, racional para os gregos, ao qual eles opunham a opinião = doxa a qual julgavam um conhecimento  aparente, portanto, desprovido de verdade.

 

Os gregos antigos diferenciavam dois tipos de conhecimento:

 

 Conhecimento VERDADEIRO: Sofia = Sabedoria: O conhecimento que se obtinha pelo uso sistemático da razão. Para eles, esse era o conhecimento filosófico.

    

Conhecimento APARENTE = Doxa:O conhecimento que se obtinha pelas sensações (sentidos), portanto, também chamado de “Opinião”.

  

Por estar fundamentado na opinião e nos sentidos, a Doxa não era considerada como conhecimento válido, embora fosse o conhecimento mais comum presente no Ser Humano.

 

A Filosofia, em sua origem, por volta do século VI e V a.C., tinha como característica principal a busca pela Sabedoria através do uso metódico da razão. Nesse sentido, ela buscava diferenciar-se do Mito, a forma de conhecimento predominante no fornecimento de explicações para s fenômenos da Natureza, para as causas e os fins de tudo o que existia.

 

Da origem do mundo e do homem até a finalidade da vida humana, tudo era “explicado” pelos mitos.

 

Os Mitos eram narrativas (historias) contadas pela tradição oral, cuja finalidade era explicar, dar sentido á realidade.

 

A presença das divindades (deuses) e a magia eram as principais características da narrativa mitológica.

 

 A Filosofia e o Mito

 

O mito, contado de geração em geração pela tradição oral, explicava a realidade a partir da força mágica dos deuses que intervinham na realidade, manipulavam os fenômenos, controlavam os homens e dominavam o mundo.

Ao longo da história humana observamos diversas dessas respostas – ou tentativas de respostas – à pergunta “Original”, contudo, nos interessa aqui, de modo especial, a resposta formulada pelos gregos anteriormente ao nascimento da filosofia por volta do final do século VII AC. Trata-se dos mitos.

Etimologicamente a palavra origina-se do grego [μυθος] "mythós" que por sua vez deriva de dois verbos:

è Mytheyo que designa contar, narrar, falar alguma coisa para outros.

è Mitheo que designa conversar, contar, anunciar, nomear, designar.[4]

Segundo um dos mais influentes historiadores da contemporaneidade, o romeno Mircea ELIADE (1907-1986) uma tentativa de definir o mito pode ser a seguinte:

“O mito é uma realidade cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e interpretada em perspectivas múltiplas e complementares (...) o mito é considerado como uma história sagrada e, portanto, uma história verdadeira, porque se refere sempre a realidades. O Mito cosmogônico é verdadeiro porque a existência do mundo está aí para o provar, o mito da origem da morte é também verdadeiro porque a mortalidade do homem prova-o”.(ELIADE, 1986, Pág 12-13).

 

De acordo com esse autor, é possível entender e compreender a realidade de um mito, bem como seu caráter de veracidade, isto é, compreender que ele é verdadeiro e que, mais que verdadeiro, ele trata de aspectos do cotidiano das pessoas buscando explicá-los, elucidá-los, tornando-os efetivamente compreensíveis ao domínio público.

O mito não é uma realidade intelectual nascida de uma teorização acadêmica, ao contrário, trata-se da explicação comum para um determinado aspecto da realidade de um grupo social, nascido da experiência coletiva desse grupo.

Dentre os gregos da antiguidade, essa foi a forma primeira que utilizaram para explicar o mundo e as coisas que aconteciam. Com o mito explicavam a vida, a morte, a saúde, a doença, a colheita, as tempestades, enfim, explicavam a realidade. Essa é a função do mito, explicar, dar sentido à realidade.

Entre os gregos antigos, os mitos existiram sob três formas específicas, isto é, havia três formas mitológicas pelas quais eles buscavam compreender e explicar o mundo à sua volta:

 

a)   As genealogias

Tudo o que existia era decorrente das relações sexuais entre as divindades, as quais seriam as responsáveis por “gerarem”, dentre outras, os demais deuses, os titãs, os heróis, os humanos, os animais, as qualidades etc. é assim, por exemplo, que explicam o nascimento de Eros (Cupido) deus do Amor. Em sua obra “Teogonia”, o poeta Hesíodo narra o nascimento de Eros como filho de Caos, porém não tardou muito para surgirem outras versões que o colocam como filho de Afrodite com Zeus, Hermes ou Ares. Eros, de acordo com a narrativa platônica exposta em “O Banquete”, é o filho originado da relação entre a deusa Pínia (Pobreza) e o deus Poro (o Expediente). Assim é a narrativa das genealogias, as coisas – como Eros, Amor – vão se originando das relações – uniões -  sexuais existentes entre as divindades.

 

b)   As Guerras ou Alianças

Outra forma de explicação mitológica recorrente entre os gregos eram as guerras ou alianças estabelecidas entre os deuses. A rivalidade encontrada provocava a aliança entre uns e a guerra entre outros, e de acordo com as narrativas, era isso que fazia surgir as coisas no mundo dos homens. É assim que acontece, por exemplo, na Guerra de Tróia narrada por Homero na Ilíada. As deusas, ao aparecerem em sonho ao príncipe troiano Paris, lhe ofereciam seus dons, rivalizando entre si. Paris, contudo, escolhe o Amor, ofertado a ele por Afrodite e isso desperta o ciúme e a ira das outras deusas, as quais o fazem raptar Helena como forma de vingança, a esposa do general grego Menelau, e é isso que dá origem à lendária Guerra de Tróia. Aliás, durante a guerra, é a própria rivalidade que explica também o fato de ora os troianos, ora os gregos vencerem a batalha, isso se deve, de acordo com o mito, ao que Zeus tende em cada momento, ou seja, a Guerra de Tróia divide também os deuses que rivalizam entre si de modo que quando Zeus apoia um dos lados, o faz vencer uma batalha, impondo a derrota ao outro, e vice-versa em outro momento. Dessa forma, é a rivalidade ou a aliança entre os deuses que faz surgir as coisas na terra dos homens.

 

c)   Os Castigos ou Recompensas

Pelo seu caráter, os deuses “deveriam” ser obedecidos pelos homens, pois sua natureza divina lhes proporcionava um lugar “mais alto” que os humanos na hierarquia dos seres. Contudo, vez ou outra eram desobedecidos pelos humanos ou até mesmo por outros deuses “inferiores”, diante disso é que aconteciam, então, os castigos, ou ao contrário, as recompensas quando eram obedecidos. Um exemplo dessa forma de narrativa é o mito de Prometeu:

 

A Prometeu e seu irmão Epimeteu foi dada a tarefa de criar os homens e todos os animais. Epimeteu encarregou-se da obra e Prometeu encarregou-se de supervisioná-la depois de pronta, assim Epimeteu atribuiu a cada animal seus dons variados, de coragem, força, rapidez, sagacidade; asas a um, garras a outro, uma carapaça protegendo um terceiro, etc. Porém, quando chegou a vez do homem, que deveria ser superior a todos os animais, Epimeteu gastara todos os recursos, assim, recorre a seu irmão Prometeu que com a ajuda de Minerva roubou o fogo que assegurou a superioridade dos homens sobre os outros animais. Todavia o fogo era exclusivo dos deuses. Como castigo a Prometeu, Zeus ordenou a Hefesto acorrentá-lo ao cume do monte Cáucaso, onde todos os dias uma águia (ou abutre) ia dilacerar o seu fígado que, por ser Prometeu imortal, regenerava-se. Esse castigo devia durar 30.000 anos.

Prometeu foi libertado do seu sofrimento por Hércules que, havendo concluído os seus doze trabalhos dedicou-se a aventuras. No lugar de Prometeu, o centauro Quíron deixou-se acorrentar no Cáucaso, pois a substituição de Prometeu era uma exigência para assegurar a sua libertação.

A história foi teatralizada pela primeira vez por Ésquilo no século V a.C. com o título de Prometeus desmotes (Prometeu Agrilhoado/Acorrentado).” [5]

Como é facilmente perceptível, o mito possui em si mesmo algumas características que o fazem ser tomado como verdadeiro tantos pelos antigos quanto pelos contemporâneos pois possuíam em seu interior a força necessária para explicar, a jovens e velhos, os aspectos mais profundos da realidade humana. Podemos destacar como características do mito:

 

a) Presença constante das divindades

O mito não acontece somente com a presença Humana. Há em seu interior a necessidade de atuação de uma ou mais divindade.

 

b) Presença do mágico

Devido a atuação das divindades, há na narrativa mitológica constantemente, a atuação de forças mágicas, fabulosas, que interpelam o homem na sua realidade e são as responsáveis pelos acontecimentos.

 

c) Mediação entre o sagrado (deuses) e o profano (humanidade)

São as forças divinas as responsáveis pelos acontecimentos que interferem e determinam a realidade humana, portanto, eis o seu papel fundamental, mediar esses dois mundos.

 

d) Explicação da vida humana

 

Embora permeado de deuses e ações fantásticas, não é a vida dos deuses ou seus humores o principal objetivo dos mitos, mas sim a vida humana. É a realidade humana que está sendo explicada na narrativa mitológica, seja ela Cosmogônica (origem do mundo) Teogônica (origem dos deuses) ou Escatológica (fim do mundo).

 

e) Primordialidade

A narrativa mitológica sempre se reporta há tempos primordiais, isto é, ao tempo da origem dos homens, ou antes deles, na origem dos deuses.

 

Durante séculos os mitos resolveram o problema proposto pela pergunta “Original”, e não pensemos que atualmente perderam sua força, ao contrário, ainda hoje produzimos mitos aos montes, porém, se antes eles contavam com a hegemonia explicadora do mundo, hoje eles têm fortes concorrentes como a Ciência, as Religiões, a Arte e também a Filosofia.

 

Os mitos foram fundamentais para que o mundo antigo tivesse algum sentido. Contudo, diversos fatores passaram a fazer com que as explicações mitológicas se tornassem insuficientes para explicar a realidade. Nesse momento, uma nova forma de explicação começa a surgir... A FILOSOFIA.

Diversos foram os fatores que influenciaram o nascimento da Filosofia, dentre os quais podemos destacar:

 

a) a geografia da Grécia

Incrustrada entre montanhas, as terras que perfaziam o território grego eram pouco favoráveis à agricultura como fonte de renda. Aliado a esse fator temos a sua posição de centralidade no mediterrâneo. Isso praticamente forçava os gregos a dedicarem-se, inevitavelmente, ao comércio marítimo e às navegações, o que lhes permitiu descobrir que os lugares habitados por deuses, titãs e heróis, segundo os mitos, eram na verdade habitados por outros seres humanos, e que as forças fabulosas não estavam presentes ali, como diziam as narrativas.

 

b) o desencantamento do mundo

As navegações provocaram certo desencantamento[6] do mundo, ou seja, ao conhecer uma nova terra, um novo local e perceber que ali não haviam monstros ou deuses ou qualquer outro elemento fabuloso como antes os mitos afirmavam, os gregos começaram a sentir a necessidade de uma nova forma de explicação do real, que o mito não poderia mais fornecer.

 

c) a vida urbana

A aglomeração de pessoas em um modo de vida predominantemente urbano trouxe uma série de necessidades e de mudanças, dentre as quais destacamos a invenção e o uso da moeda, que estimulou o desenvolvimento do pensamento abstrato e trouxe consigo também a invenção do calendário e da escrita alfabética entre os gregos.

 

d)   o nascimento da Política

A vida Urbana, o pensamento abstrato, poderíamos dizer, não são outra coisa senão decorrências de uma das maiores contribuições dos gregos para a civilização ocidental, a saber, a ideia de “Pólis”[7]. Dela origina-se, posteriormente a “Política”  e desta, num processo dialético, a Filosofia.

 De modo geral, inúmeros fatores contribuíram para o surgimento da Filosofia, contudo, mesmo com a Filosofia, os mitos não perderam sua força, mas foram lentamente cedendo espaço para as teorias filosóficas.

 

Depois de ler atentamente o texto, assista também aos vídeos indicados.

Basta clicar no link ou copiá-lo no seu navegador.

Pode ser que o link dos vídeos não fique ativo no seu pc. Isso se deve às suas configurações de segurança. Nesse caso, para acessar os links, pressione a tecla "Ctrl" e clique sobre o link; a página se abrirá automaticamente.

 

https://www.youtube.com/watch?v=KuPYR5fuHr8&hd=1 Filosofia: O que é? Para que serve? (Autora: Lívia Frazão. Duração 4:13 min)

https://www.youtube.com/watch?v=fGxrFw9RBQk&hd=1 Filosofia: O que é isto? (Autor: Paulo Ghiraldelli Jr. Duração 5:13 min)

https://www.youtube.com/watch?v=DHSobPyPD08&hd=1 A origem da Filosofia (Autor: Svem Bork. Duração: 4:08 min). Obs* Vídeo produzido por alunos de 1º Colegial)

https://www.youtube.com/watch?v=bz9wBXaQr0w&hd=1 Telecurso. Aula 1. Origem da Filosofia (Duração 14:32 min).

 

 

Professor Ms Claudemir G. Oliveira

 

 

 


 


 

A U L A   2

 

EXPECTATIVAS DE APRENDIZAGEM

Metas: Ao final desta unidade esperamos que você:

  • Identifique as peculiaridades do pensamento filosófico.
  • Perceba as diferenças entre Mito e Filosofia

INTRODUÇÃO

 

Desde os primórdios da humanidade o homem sempre se preocupou em compreender e explicar o mundo à sua volta, sempre se preocupou em obter respostas para algumas perguntas fundamentais como:

De onde vim?

Para onde vou?

Quem sou eu?

Tais perguntas sempre fizeram parte do imaginário coletivo da humanidade. Constitui-se uma dimensão natural do homem, uma curiosidade natural querer saber sua origem, seu destino, sua constituição, enfim, sua própria identidade. Porém, se as perguntas sempre existiram, as respostas para elas também da mesma forma, sempre existiram.

Se observarmos os registros mais antigos da humanidade, em qualquer cultura, encontraremos tentativas de respostas para a pergunta acerca do sentido da existência do homem, afinal, é disso que se trata; esclarecer qual o sentido de nossa existência.

Nas pinturas rupestres do homem das cavernas, encontramos referências a essa questão, o mesmo nos manuscritos de Qunran[2] e tantos outros registros já encontrados e catalogados pelas ciências como a antropologia e a arqueologia, de registros muitas vezes incontestáveis devido à utilização dos testes realizados com o radiocarbono[3] também conhecido como carbono 14.

Mas, ainda que as perguntas se estendam pela eternidade da existência humana, será que as respostas encontradas sempre foram as mesmas? Será que em todos os momentos da história da humanidade, em que uma resposta foi proposta, ela foi suficientemente aceita? E o que dizer sobre a forma utilizada para encontrar tal resposta.

Uma resposta suficientemente aceita é aquela que dá conta de responder, de modo satisfatório, à pergunta que a originou. Portanto, se a pergunta ainda persiste isso se deve inevitavelmente ao fato de que as respostas obtidas não atendem a todas as expectativas de todos os homens em todos os momentos de sua existência.

É perfeitamente aceitável que cada área do conhecimento humano busque contribuir de forma efetiva para com a formulação dessa resposta, porém, da mesma forma, é também perfeitamente aceitável que tais contribuições sejam insuficientes para dar conta de toda a complexidade que essa pergunta exige, e que por isso mesmo ousaremos chamá-la de “Original”.

 Como já vimos, nenhuma resposta foi suficientemente completa para dar conta de responder à pergunta “Original”, nem mesmo o mito.

Diferente do que muitos imaginam, a filosofia, em seu nascimento, não se constitui como uma ruptura com o mito, tampouco como uma oposição a ele, mas nasceu como uma nova forma de olhar aquilo que os mitos já haviam proposto como explicação da realidade humana

Sendo assim, a filosofia buscará, a exemplo dos mitos, construir uma explicação para a realidade e os seus fenômenos, contudo, baseará sua investigação em outros princípios, diferentes daqueles mágicos e fabulosos encontrados no mito.

 

Características do conhecimento filosófico

Tomaremos como referência o que aponta o professor Dermeval SAVIANI, “a filosofia é uma reflexão (radical, rigorosa e de conjunto) sobre os problemas que a realidade apresenta” [8]. Analisemos detalhadamente essas características, pois são elas que nos dão a dimensão exata do ponto em que a filosofia nascente da grécia aparece como “superação” da narrativa mitológica.

 

a) a filosofia é radical

O que significa ser radical? O que seria algo radical?

Você com certeza já pensou em esportes radicais, como por exemplo, andar de skate, fazer aquelas manobras arrojadas, ou então saltar de “bung jump”, fazer rappel, trilhas, motovelocidade enfim, um infinidades de coisas atualmente respondem pelo sentido de radicalidade. Contudo, será que são mesmo radicais? E se o são, o que justifica sua radicalidade?

Pois bem, examinemos com calma e tomaremos algo que seja realmente radical. A mandioca!

Com certeza lhe causamos certa estranheza, e você deve estar se perguntando um tanto quanto incrédulo: O que mandioca tem a ver com radical?

Pois eu lhe asseguro que nessa vida, nada há mais radical que a mandioca. Pode haver algo tão radical quanto, porém, mais radical certamente não há. A palavra “Radical” indica aquilo que se refere à raiz. Pois bem, mandioca é radical, pois é a raiz de um arbusto cujo nome científico é Manihot esculenta[9]. Como dissemos, portanto, nada é mais radical que a mandioca. Mas e a filosofia, por que é radical?

Pelo mesmo motivo que a mandioca o é. A reflexão filosófica não se contenta com as aparências das coisas, mas quer encontrar a raiz das questões, as suas causas primeiras. O que dizer então da pergunta “Original” à luz da filosofia? Os primeiros filósofos – os Jônicos – buscaram encontrar a causa primeira de tudo o que existe e a denominaram “Arché”.

 

b) a filosofia é rigorosa

Imagine-se andando na rua de uma grande cidade, movimento de pessoas apressadas, carros indo e voltando, motocicletas, vendedores ambulantes e tudo mais que uma cidade tem de poluição sonora e visual, e você está sem relógio. Querendo saber das horas, interpela alguém que passa por você e educadamente lhe pergunta:

_ Você, por gentileza, tem horas?

O transeunte, apressado, lhe olha, acena com a cabeça e responde que “sim”, porém, sem dar-lhe mais confiança, segue apressado seu caminho.

Certamente você já o classificou como mal educado. Mesmo apesar de toda sua polidez, a pessoa sequer dignou-se a responder-lhe sua pergunta corretamente. Porém, voltemos cuidadosamente à cena; qual foi a sua pergunta?

_ Você, por gentileza, tem horas?

À sua pergunta, para um ouvinte mais atento, somente há duas possíveis respostas: Sim ou Não, e seu interlocutor foi rigoroso na resposta. Ora, se você quer saber que horas são agora, porque não formula a pergunta corretamente, de forma que a resposta seja exatamente a que você procura, po exemplo:

_ Você poderia, por gentileza, me dizer que horas são agora?

Isso é ser rigoroso, é ser exigente, exato, preciso. A reflexão filosófica busca exatamente essa dimensão da realidade humana. Não há espaços, na filosofia, para a imprecisão, para o meio termo. As coisas são ou não são.

 

c) a filosofia é “de conjunto”

Todos nós permanecemos atentos aos jogos olímpicos de Pequim e ao final das competições tínhamos um sentimento comum. Vimos algumas medalhas de ouro contadas como certas nos escaparem pelos dedos. Foi o caso, por exemplo, do vôlei masculino, tanto o de quadra quanto o de praia. Outra situação comovente foi a derrota “desconcertante” para os “Hermanos” no futebol masculino e para as “Gringas” no feminino. Os comentaristas esportivos alardeavam após as competições: “Perdemos o ouro!”.  Ora, uma constatação simples nos indica que o verbo “perder” está sendo conjugado na 3ª pessoa do plural – “nós” – e indica, portanto, que eu e você tivemos alguma coisa a ver com essas derrotas. Porém, poderíamos nos perguntar: “Nós” efetivamente estávamos lá? Qual foi a sua ou a minha contribuição naqueles jogos para que fosse possível atribuir a derrota a “nós”?

E no caso de vitórias? Qual será a sua ou a minha parcela no prêmio para que nos seja possível dizer que “nós” ganhamos medalha de ouro, de prata ou ainda o bronze nessa ou naquela modalidade esportiva?

Nesses casos trata-se claramente de uma generalização apressada e indevida, somente possível se observarmos apenas uma parte do fato. Ora, a seleção brasileira de vôlei masculina, comandada pelo técnico Bernardinho, perdeu o último jogo para a seleção norte-americana, e com isso conquistou a medalha de prata, porém, foram eles, os jogadores, técnico e no máximo poderíamos incluir a comissão técnica. Os torcedores ali presentes talvez também tenham tido uma parcela mínima de contribuição ao incentivar ou não o time, porém, imaginamos que “nossa” possível participação encerra-se aí. Não foi o “Brasil” que ganhou ou perdeu, foi a seleção, e como o próprio termo já indica, algumas pessoas selecionadas por esse ou aquele motivo, porém, algumas pessoas somente.

Fora o alcance dos desdobramentos político-ideológicos – muito mais ideológicos que políticos - que possam ter uma vitória ou derrota numa competição esportiva, não há nenhum outro fato que ligam você ou eu ao resultado desses eventos.

O que estamos dizendo é que tais “generalizações” somente são possíveis porque toma-se indiscriminadamente uma parte pelo todo. Isso não é filosófico. Não podemos generalizar a característica de um elemento para o grupo todo, mas para isso, é preciso ser capaz de uma abordagem adequada do “todo”.

O conhecimento filosófico busca, incansavelmente, a visão do todo, a percepção do conjunto, e não pode ser parcial.

Observemos, por exemplo, um cartun de Quino[10] onde se passa o seguinte diálogo entre as personagens Mafalda e Susanita:

 

Mafalda: _ Quando eu vejo um pobre fico com o coração apertado!

Susanita: _ Eu também

Mafalda: _ Deviam dar casa, trabalho, proteção e bem-estar aos pobres.

Susanita: _ Pra que tudo isso? Era só escondê-los![11]

 

A personagem Mafalda preocupa-se com o conjunto do problema. Percebe o problema da pobreza em sua totalidade, e é isso que a aflige, já sua amiga Susanita ocupa-se apenas com um dos aspectos: a aparência. Não demonstra preocupação com o problema, apenas com seu aspecto visível, portanto, a solução mais prática é simplesmente escondê-lo.

Assim é o conhecimento filosófico, nunca está satisfeito com a parcialidade, em esta lhe tem alguma validade, a não ser como ponto de partida para a construção do conhecimento.

A dimensão de totalidade, ou de conjunto, não significa dizer que o filósofo tenha a pretensão – ingênua – de conhecer TUDO. Apenas significa que não é possível conhecer verdadeiramente sem uma visão ampla do conjunto. É a dimensão de totalidade que pode nos fornecer o equilíbrio necessário para a construção de um conhecimento verdadeiramente coerente e coeso, sem lacunas ou contradições.

 

Percebemos enfim, que a filosofia, pelas suas características, constitui-se como uma postura que o sujeito assume diante da realidade que o cerca, postura essa marcada pela presença indelével da capacidade de crítica e ressignificação das coisas e do mundo.

 

 

SÍNTESE DA UNIDADE

Nessa unidade estudamos o que é e sobre o que trata o conhecimento filosófico. Para tanto estudamos uma forma de explicação da realidade que antecede o conhecimento propriamente filosófico, o mito, e identificamos as distinções fundamentais entre ele e a Filosofia.

Com efeito, o mito consiste em um discurso, uma narrativa sobre a origem de alguma coisa, ele explica, ordena e interpreta a origem do mundo e de tudo o que existe nele. O Mito é caracterizado, como vimos, por ser uma narrativa que lança mão de elementos fabulosos e divinos na sua constituição.

Assim como o Mito a Filosofia também está preocupada com os problemas implicados na realidade humana. No entanto, diferente da narrativa mítica, a Filosofia se caracteriza por uma reflexão radical, rigorosa e de conjunto. Isso quer dizer que a Filosofia não aceita o terreno do fabuloso, do mágico e procura uma reflexão com coerência interna e definições rigorosas de conceitos.

Desse jeito, embora a Filosofia se preocupe com a realidade do mundo, assim como o Mito, ela surge como algo diferente na medida em que é resultante de uma ruptura em relação à atitude diante do saber recebido. “Enquanto no mito é uma narrativa cujo conteúdo não se questiona, a filosofia problematiza e, portanto, convida à discussão. Enquanto no mito a inteligibilidade é dada, na filosofia ela é procurada” (ARANHA, 1993). A filosofia, assim, põe de lado o sobrenatural enquanto explicação dos fenômenos e lança mão de uma atitude crítica diante a realidade humana.

 

APÓS LER ATENTAMENTE O TEXTO, ASSISTA AOS VÍDEOS INDICADOS ABAIXO, ELES O AJUDARÃO A COMPREENDER MELHOR O TEMA ESTUDADO.

 

Vídeo 01

https://www.youtube.com/watch?v=pVHv-cnz_Z0&hd=1 “O Conhecimento” (3,43 min)

 

Vídeo 02

https://www.youtube.com/watch?v=z_QopjQslBw “Tipos de conhecimento” (3,46 min)

 

Vídeo 03

https://www.youtube.com/watch?v=S6T8_GBjoOc&hd=1 “O Conhecimento Filosófico” (2,11 min).

 

BIBLIOGRAFIA

ARANHA, Maria Lucia Arruda. História da Educação. São Paulo: Moderna, 1989.

COULANGES, Fustel. A cidade antiga. Tradução Frederico Ozanam Pessoa de Barros. Lisboa: Edameris, 1967.

CHAUI, Marilena. Filosofia. São Paulo: Ática, 2004.

_______ Convite a filosofia. São Paulo: Ática, 2005.

_______ Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles, volume I. São Paulo: Brasiliense, 1994.

GHIRALDELLI JR, Paulo. Filosofia da Educação. São Paulo: Ática, 2006.

PLATÃO. A República; apresentação e comentários de Bernard Piettre, tradução de Elza Moreira Marcelino. Brasília: Editora Universidade de Brasília; São Paulo: Ática, 1989.

 

 

 


[1]OLIVEIRA, Claudemir. Filosofia da Educação. Araras – SP: NEAD Uniararas, 2008.  O texto refere-se à Unidade I – Conhecimento Filosófico - do material didático desenvolvido para a disciplina Filosofia da Educação no NEAD (Núcleo de Educação a Distancia) da Uniararas.

[2] Refere-se aos “rolos” de pergaminhos encontrados nas cavernas de Qunran em 1948, que segundo documentos históricos trata-se de originais dos textos bíblicos (judaico-cristãos) escondidos nas cavernas pelos judeus antes dessa comunidade - Qunran - ter sido dominada e destruída pelos romanos. Também são conhecidos como “pergaminhos do mar morto”

[3] A técnica do carbono-14 foi descoberta nos anos quarenta por Willard Libby. Ele percebeu que a quantidade de carbono-14 dos tecidos orgânicos mortos diminui a um ritmo constante com o passar do tempo. Assim, a medição dos valores de carbono-14 em um objeto antigo nos dá pistas muito exatas dos anos decorridos desde sua morte.Esta técnica é aplicável à madeira, carbono, sedimentos orgânicos, ossos, conchas marinhas - ou seja todo material que conteve carbono em alguma de suas formas. Como o exame se baseia na determinação de idade através da quantidade de carbono-14 e que esta diminui com o passar do tempo, ele só pode ser usado para datar amostras que tenham até cerca de 50 mil a 70 mil anos de idade. (Wikipédia)

 

[4] CHAUI, 2004, Pág 23.

[5] http://pt.wikipedia.org/wiki/Prometeu  acessado em 25/08/2008

[6] Desencantamento refere-se ao fato de perder o encanto, a magia, o mistério, essenciais ao mito.

[7] Para aprofundamento do conceito de surgimento e evolução da Polis na Grécia, consultar:

 COULANGES, Fustel. A Cidade Antiga. Tradução Frederico Ozanam Pessoa de Barros. São Paulo; Edameris, 1967. Versão digitalizada disponível em http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/cidadeantiga.html

[8] SAVIANI, Dermeval. Educação brasileira; estrutura e sistema, pág 69 apud ARANHA, Maria L de Arruda. História da Educação. São Paulo: Moderna, 1989. Pág 6

[9] No Brasil possui muitos sinônimos, usados em diferentes regiões, tais como candinga, castelinha, macamba, maniva, maniveira, moogo, mucamba, pão-da-américa, pau-farinha, uaipi, xagala, dependendo da região em que se encontra.

[10] QUINO, Joaquín Salvador Lavado, nasceu em 17 de Julho de 1932 na província Argentina de Mendoza. Atualmente é considerado um dos maiores cartunistas do mundo. A “tira” reproduzida acima contempla seu personagem mais famoso, a menina Mafalda que com sua inquieta alma infantil questiona o mundo e todos os problemas que a afligem. Acima ela conversa com sua amiga Susanita, para quem a vida é uma imensa vitrine repleta de futilidades as quais ela deseja ver sempre bela, inútil, mas bela aos olhos. Os questionamentos da Mafalda começaram a ser publicados em 1964 em diversas “tiras” de jornais, e foram interrompidos em 1973, porém, seu valor como crítica ao comportamento contemporâneo rendeu o devido reconhecimento ao seu criador.

[11] [QUINO, Mafalda.  apud GUIRALDELLI, 2006, pag 14]